MARCOS DANTAS - Na vila chamada Banco Central, lugarejo onde nasci, encravado entre duas serras, lá no Sul da Bahia, município de Ilhéus, entre tantas figuras pitorescas, conheci com meus olhos de criança o seu Valentim; (será que a brabeza dele tinha a ver com o nome?) fato é que o sujeito era um baiano bruto, rústico e muito, mas muito sistemático.
Para se ter idéia, seu Valentim, que raramente comprava uma
camisa nova, quando isto acontecia, ainda na loja ele arrancava logo os botões,
seu sistema era usar a dita-cuja aberta. Certa feita, ele entrou com esta
desabotoada no ônibus e o motorista lhe chamou atenção, ao que ele rispidamente
respondeu “eu deço mas não abutuio”.
Historicamente o pioneiro sistema a ser implementado por
aqui foi o sócio-político-econômico escravocrata. Relação esta entre senhor e escravo
que serviu de alicerce que estruturou o voraz estado brasileiro. E nessa
moldura vivemos escravos do sistema que não é o do seu Valentim que a única vez
que pisou em um banco queria falar com o dono do mesmo. “Se não posso falar
com o dono intão não vou botar meu dinheiro aqui”.
Os tempos modernos além de franquear a tecnologia também
escraviza com seu implacável e feroz sistema. Você já é o ‘ultimo do
derradeiro’ na fila e quando chega a sua vez, ouve: o sistema caiu, o sistema
está lento, o sistema o sistema não libera, o sistema acusa que o senhor(a)
deve a deus e ao mundo, o sistema está fora do ar, o sistema só libera até esse
limite, aqui pelo sistema o senhor(a) não é o senhor(a)...
Naquele tempo o freguês ia na ‘venda’ comprar alguma coisa e
se o nome tivesse ‘sujo’ no livro, então era informado pelo dono (sistema) da
venda que havia atraso de pagamento e que por isso não seria possível atende-lo
naquele momento... a situação poderia ser logo revertida caso o devedor
apresentasse uma boa justificativa acompanhada da promessa de pagamento o
quanto antes.
Depois do sistema dominar todos e tudo o cidadão(ã) que paga
caro por tudo, inclusive leva uma pesadíssima e insuportável carga tributária é
obrigado(a) abaixar a cabeça, ainda que revoltado, mas como bom escravo(a) nada
dizer, nada reclamar nem com ‘o bispo’, como se dizia...
O sistema é o cruel senhor do engenho, o capitão da senzala.
Com uma mão lhe oferece benesses quando quer, e com a outra lhe chicoteia até a
alma, sem compaixão, não há direitos humanos que incrimine, policie os atos do
sistema contra cada ser humano, em especial os menos favorecidos, desprovidos
de meios para se defender ou driblar os golpes certeiros do algoz.