sexta-feira, 9 de março de 2012

CONSELHOS DE COMUNICAÇÃO Quem está censurando quem?

 por Marlos Mello* em 21/02/2012

“O tabu que eu falo aqui, da comunicação e do debate,é um tabu carregado de estigmas, porque conselho de comunicação virou sinônimo de controle da mídia, virou sinônimo de censura, que é o absurdo dos absurdos porque censuram a nossa liberdade de discutir comunicação”(Robinson Almeida, secretário de Comunicação do Estado da Bahia, durante o seminário “Comunicação em Pauta”, realizado em Porto Alegre, RS, 8 de dezembro de 2011)

A discussão da relação comunicação e censura talvez ainda seja o grande “tabu” presente na democracia brasileira. No entanto, esse é um dos temas mais significativos para a compreensão dos novos cenários políticos e econômicos que compõem a sociedade. É inegável que nessas mais de duas décadas de redemocratização da política brasileira aconteceram avanços e conquistas em vários espaços sociais e em várias áreas de atuação. Avanços importantes em segmentos antes fadados e tachados como inadequados, o que é o caso da participação das mulheres na política, por exemplo. Hoje temos a primeira mulher presidenta do Brasil e houve a ascensão de setores das esferas mais exploradas da sociedade que passaram a ocupar espaços de poder. Segmentos sociais também discriminados estão tendo a oportunidade de ocupar espaços importantes na política brasileira.

Mas se, por um lado, o Brasil avançou, por outro ainda é um país imerso em proibições, estigmas e interdições. Dentre essas, uma com um grande valor de importância é o tema dos conselhos de comunicação que, segundo o secretário Robinson Almeida, é o ponto estratégico que precisa ser enfrentado pela sociedade brasileira.
Cenário de polêmicas

A comunicação no Brasil, no sentido econômico, tem funcionado como mero valor de troca comercial, empresarial e político. É um capital relevante para o processo produtivo, transforma-se em consumo imediato e é temporário e descartável porque a última tecnologia é a que tem valor. A comunicação, no sentido neoliberal, não é agente de transformação, mas apenas um dos elementos que agregam valor à mão-de-obra e um dos garantidores de que o produto final terá consumidores.

No entanto, o que faz o tema da comunicação ser tão polêmico é a forma como vem sendo abordado pelas autoridades ao longo de muitos anos. Ao contrário do que acontece na educação, na saúde e na assistência social – serviços vitais e básicos que têm, além do conselho nacional, conselhos estaduais e municipais que possuem a finalidade principal de servir como instrumento para garantir a participação popular na construção das políticas e dos serviços públicos –, a comunicação parece não possuir esse direito.

Técnica versus sociedade democrática

Durante sua fala no Seminário “Comunicação em Pauta”, o secretário Robinson Almeida fez o seguinte comentário: “A sociedade que nós temos que ter como sociedade democrática é uma decisão dos homens e das mulheres pra que o modelo possa convergir e não uma imposição da técnica sobre a vontade humana. Então, não é a economia que deve presidir a política, não é a comunicação que deve presidir a política, é a política no sentido amplo, do desejo coletivo, pactuado na sociedade, não to falando na política no sentido pequeno dela do espaço de poder. Então, essa compreensão que nos levou a pensar uma estratégia de elevar a comunicação a um status de política pública” Robinson Almeida, secretário de Comunicação do Estado da Bahia, durante o seminário “Comunicação em Pauta” realizado em Porto Alegre, RS, 8 de dezembro de 2011.

Na minha interpretação, o que o secretário Robinson quer dizer é o seguinte: a criação de conselhos de comunicação passa pela vontade das pessoas, homens e mulheres, que devem decidir sobre o assunto. E mais: essa vontade não pode ser representada apenas pela técnica, ou então pela argumentação ideologizada, mas sim, pelo debate amplo “na” e “da” sociedade. Na Bahia, por exemplo, já foram promovidas duas conferências estaduais de comunicação com o objetivo de evidenciar os problemas e as soluções para a política de comunicação no estado e essas conferências auxiliaram no processo de criação do Conselho de Comunicação do Estado da Bahia.

Contudo, considerando-se através de um panorama geral brasileiro, é possível perceber que embora haja debates sobre comunicação por todo o Brasil, os debates “legitimados”, ou seja, os que valem mesmo, sobre a comunicação, estão localizados especificamente em dois espaços da sociedade: a) nas universidades e b) nos órgãos de imprensa. São esses dois organismos da sociedade, principalmente o “b”, que pautam o tema da comunicação no cenário político brasileiro.

Uma sugestão final

De maneira geral, parece não haver dúvidas de que, assim como a saúde, a educação e a assistência social, a comunicação é um tema de grande importância que deveria ser tratado com total transparência. No entanto, mesmo fazendo parte dos temas “quentes” e abrigando grandes contradições, a comunicação não é levada a sério quando se fala em controle social. Para mim, a comunicação no Brasil encontra-se numa “névoa”, num espaço onde não podem ocorrer debates, ou melhor, onde se debate de tudo menos comunicação. Nesse espaço, só alguns possuem o conhecimento necessário e podem ter o direito de falar sobre comunicação. E mais: só alguns podem regulamentar o famoso tema da “autorregulamentação”.

Sobre o que foi destacado acima, Vera Spolidoro, secretária de comunicação do Estado do Rio Grande do Sul, tem a seguinte opinião: “Se o estado mostrar-se submisso à agenda da mídia estará dependente de uma agenda de classe em disputa. Os sistemas de comunicação comercial no Brasil quase sempre constituem a principal fonte de informação para a maioria da população e sob monopólio exercem determinações sobre a cultura, política e sobre a economia. Cabe, portanto, entender os limites dessa interdependência na execução de uma política pública de comunicação” (Vera Spolidoro, secretária de Comunicação do Estado do Rio Grande do Sul durante o seminário
 “Comunicação em Pauta” realizado em Porto Alegre, RS, 8 de dezembro de 2011).

Assim, é necessário o abandono dessa “névoa”, desse “estigma”, dessa “censura”, como afirmou o secretário Robinson Almeida, que não permite o debate da comunicação no Brasil. Os conselhos de comunicação representam uma das possibilidades de se fazerem debates democráticos, amplos e abertos sobre quaisquer temas propostos, inclusive a democratização dos meios de comunicação e a regulamentação dos artigos da Constituição. Romper com essa lógica perversa de que a comunicação não é importante ao interesse público é papel de todos.

Uma sugestão final aos leitores deste artigo. Comecem observando e pensem se os órgãos de comunicação da sua cidade são os ideais, se correspondem à proposta de uma cobertura democrática e ampla dos acontecimentos cotidianos. Questionem os espaços de participação nos meios de comunicação, especialmente rádio e televisão, que são concessões públicas e têm de garantir o direito à comunicação.

* [Marlos Mello é psicólogo social, Porto Alegre, RS]

Fonte: http://www.abracogoias.org/conselhos-de-comunicacao-quem-esta-censurando-quem

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